Mamãe de 50 filhos!!!

Mãe de 50 filhos e tema de filme, Missionária brasileira Flordelis ganha livro com sua biografiaVárias personalidades prestigiarão o lançamento da biografia da missionária Flordelis na próxima segunda-feira, 4 de abril. O evento, que será na Livraria Travessa do Shopping Leblon, no Rio de Janeiro contará com a presença de famosos como Fernanda Lima, Fernanda Machado, Cauã Reymond, Reinaldo Gianecchini, Rodrigo Hilbert, Bruna Marquezini, Alinne Moraes, Cris Vianna, Ana Furtado, Isabel Fillardis, Silvia Pffeifer, Sérgio Marone, Luana Piovani, Erick Marmo e Isabeli Fontana.
O livro será lançado pela Thomas Nelson Brasil – a mesma editora que lançou a autobiografia de Aline Barros – e conta a história da mulher que enfrentou a pobreza, a violência e o preconceito para dar uma nova vida e o amor de uma verdadeira mãe a dezenas de crianças.
A obra mostra, de maneira envolvente, as batalhas que a autora teve de enfrentar para conquistar a guarda e confiança de seus filhos, desde a adoção da primeira criança até a mais recente, passando ainda pelo nascimento de seus quatro filhos biológicos.

Conhecida como a "missionária do tráfico", Flordelis dos Santos de Souza conta sua trajetória a Marie Claire



Jorge Bispo

Flordelis dos Santos de Souza tinha 14 anos quando seu pai e seu irmão morreram em um acidente de carro. A reação dela ao receber a notícia surpreendeu a todos na comunidade do Jacarezinho, onde nasceu e foi criada. Ela chamou amigos e passou a noite compondo a música que cantou na cerimônia de sepultamento. Uma multidão acompanhou o enterro. Ali, ela deu o primeiro sinal de possuir um dom para lidar com tragédias. Nos anos que se seguiram, Flordelis dividia seu tempo entre o canto religioso (ela é evangélica), o trabalho de balconista em uma padaria, o marido e os três filhos. Também era procurada por moradores da comunidade para resolver problemas deles com o tráfico de drogas. Agia como uma líder comunitária em Jacarezinho. Ganhou a alcunha de “missionária do tráfico”. Aos 29 anos, outro drama marcou sua vida. O marido a deixou, e Flordelis passou a cuidar sozinha dos filhos. Quatro anos depois, a missionária decidiu fazer do abandono sua causa pessoal. Adotou a primeira das dezenas de crianças a quem chama de filhos. Há 15 anos, Flordelis salva crianças do tráfico. São 50 filhos, entre biológicos e adotados. A grande família vive em uma casa de classe média alta, em Niterói, no Rio de Janeiro — ela conta com a ajuda do empresário Pedro Werneck para pagar o aluguel. As idades variam de três a 34 anos. Depois de ser tachada de santa, louca e criminosa, a história dela será contada no documentário Flordelis: basta uma palavra para mudar, em cartaz este mês. Globais como Fernanda Lima, Reinaldo Gianecchini, Letícia Sabatella, Deborah Secco, Cauã Reymond e Marcelo Antony toparam fazer o filme sem ganhar nada para ajudar Flor, como é chamada, a educar seus filhos. O dinheiro das bilheterias deverá ajudá-la a comprar sua casa própria. Outra esperança é a de que com sua história retratada na telas, o preconceito a seu respeito diminua — no filme, Flor interpreta ela mesma e sua voz aparece em off em algumas cenas. Recentemente, alguns moradores se manifestaram contra sua presença no condomínio onde vive com seus filhos, em Niterói. Argumentaram que a família poderia desvalorizar a área. Foi nesta mesma casa que Flordelis recebeu Marie Claire para a entrevista que você lê a seguir e que um de seus filhos tocou Bach e Villa Lobos em um piano de cauda para os jornalistas.
“A mãe ia dar a filha recém-nascida para um bêbado criar. Na mesma hora, pedi para ficar com o bebê”
MarieClaire Fazer esse trabalho, criar essa grande família era um plano, um objetivo de vida?
Flordelis dos Santos de Souza Não mesmo. Eu tinha 33 anos e três filhos [Simone, 15, Flávio, 14, e Adriano, 6 anos] quando peguei a primeira menina para criar. Raiane tinha 15 dias e estava abandonada em um terreno baldio, no meio do lixo, perto da Central do Brasil. Era janeiro de 1994. Fui à Central a pedido de uma mãe que procurava pela filha que havia fugido de casa por causa de drogas. No Rio, criança de comunidade quando foge vai para a Central do Brasil ou para Copacabana. Nesses lugares é mais fácil arrumar dinheiro com prostituição e venda de drogas. Logo que cheguei à Central, avistei uma calçada com um monte de bebês. Algumas mães costumavam deixar suas crianças enquanto se prostituíam. Conversei com uma delas, que estava muito drogada. Ela contou que tinha deixado a filha num terreno baldio vizinho. Enquanto falava da filha, ria e chorava... ia dá-la para um bêbado criar. Na mesma hora, pedi que deixasse o bebê para eu cuidar. Fomos juntas pegar a Raiane e a levamos para casa. Disse que poderia voltar quando quisesse para ver o bebê. Uns dias depois, ela apareceu em casa assustada, pedindo para eu proteger outras crianças que estavam dormindo no calçadão da Central. Disse que um policial à paisana havia passado por lá de carro à noite e que tinha atirado para todos os lados. Pelo menos 37 sobreviveram.
MC E então você decidiu ficar com todas?
FSS Sim. A mãe da Raiane pegou todas e levou para minha casa.
MC Mas a senhora tinha condições de abrigar todo mundo?
FSS Nenhuma. Ficaram 47 pessoas morando numa casa de dois quartos, cozinha e banheiro. Eu, os meus três filhos biológicos do primeiro casamento, os cinco meninos que já tinha tirado do tráfico, a Raiane e as 37 crianças do tiroteio. Além do meu segundo marido, o Anderson [do Carmo], que sempre me apoiou.
MC Como você conseguiu sustentá-los?
FSS Parte vinha da aposentadoria da minha mãe, do salário do meu marido, que era funcionário do Banco do Brasil, e de um ou outro apoio do pessoal da Igreja. Depois, precisei de mais e fui procurar ajuda do Betinho[o sociólogo Hebert Souza, morto em 1997 em decorrência da AIDS] . Ele me achou doida, mas ajudou. Durante três meses, mandou comida lá pra casa e depois conseguiu que um telejornal da TV Globo fizesse uma reportagem sobre o meu trabalho. Por causa dessa matéria, o empresário Pedro Werneck ficou sabendo da minha história e passou a depositar semanalmente R$ 50 em nossa conta bancária, um bom dinheiro em 1994. Assim, nossa vida melhorou. Mas, por outro lado, a matéria trouxe um problema. Foi por causa dela que o juiz Liborni Siqueira soube da minha existência e me chamou para depor. Queria saber quem eram aquelas crianças, de onde elas tinham surgido e o que eu fazia com elas dentro de casa. Eu estava com elas desde o início do ano, e em novembro o juiz quis tirá-las de mim, distribuindo todas pelos Juizados de Menores do Rio. Eu me recusei a aceitar a ordem. O juiz bateu na mesa e perguntou se eu sabia com quem estava falando. Respondi: “O senhor é o juiz, e eu sou a Flordelis”.
“Os traficantes me deixavam entrar nas bocas porque achavam que eu era louca”
MC O que aconteceu em seguida?
FSS Recebi dois mandados de prisão, um por desacato a autoridade e outro de busca e apreensão das 37 crianças. Eu tinha 24 horas para entregá-las. Fiquei desesperada e decidi fugir. Fomos todos para um apartamento emprestado no Irajá, no subúrbio do Rio. Conseguimos ficar ali quatro meses, até que o Juizado de Menores nos localizou. É difícil esconder tanta gente! Fugimos de novo. Passamos a primeira noite embaixo de uma marquise do bairro Parada de Lucas, perto da comunidade do Vigário Geral, um lugar bem violento. No dia seguinte, a minha foto estava em todos os jornais da cidade. Eu tinha me tornado sequestradora de crianças. Mesmo assim, o presidente da associação dos moradores desse bairro nos ofereceu ajuda para nos esconder e, claro, aceitamos. Fomos para uma casa ali perto, onde ficamos mais quatro meses, até a hora em que a situação ficou completamente insustentável. Com a notícia de que eu era sequestradora, o Pedro Werneck interrompeu a doação. Nós não tínhamos mais nada, estávamos sem saída. Com a ajuda de uma funcionária da ONU, Marlene Loro, que me conhecia desde Jacarezinho, decidimos dar uma entrevista coletiva para eu me explicar. Assim consegui que a Justiça reavaliasse a situação. Dias depois, uma junta médica chegou à casa onde a gente estava para ver como as crianças viviam. Havia médicos, psicólogos e um advogado. A casa era pequena para tanta gente, mas dava para ver que cada um dos meus filhos tinha as coisas organizadas e que ninguém andava descalço. Os profissionais perceberam que ali existia uma família de verdade.
MC Então você ganhou a guarda das crianças?
FSS Não imediatamente. Primeiro, o caso passou a ser estudado por outro juiz, o Siro Darlan de Oliveira, mais amigável que o primeiro. Ele me perguntou se eu estava disposta a fazer um acordo: eu tinha um mês para alugar uma casa com, no mínimo, seis quartos e três banheiros, e fora da comunidade. Aceitei na hora.
Ana Ottoni


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"Todo aquele que ler estas explanações, quando tiver certeza do que afirmo, caminhe lado a lado comigo; quando duvidar como eu, investigue comigo; quando reconhecer que foi seu o erro, venha ter comigo; se o erro for meu, chame minha atenção. Assim haveremos de palmilhar juntos o caminho da caridade em direção àquele de quem está dito: Buscai sempre a Sua face."
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